Você herda a vontade de mexer as pernas? O papel da genética na Síndrome das Pernas Inquietas
A Síndrome das Pernas Inquietas (SPI) — ou doença de Willis-Ekbom — é um distúrbio neurológico caracterizado por vontade irresistível de mover as pernas e sensações desconfortáveis que pioram em repouso e à noite, afetando o sono e a qualidade de vida. A condição é comum e tem base poligênica, isto é, envolve vários genes de pequeno efeito somados a fatores ambientais.
O que é a SPI
A SPI cursa com necessidade de mover as pernas, geralmente acompanhada de formigamento, queimação ou sensação de “arrasto”. Os sintomas são mais intensos à noite e melhoram com movimento. Estima-se prevalência de 5% a 10%, com maior frequência em mulheres e aumento com a idade.
Herança familiar
A SPI apresenta forte agregação familiar: até 60% dos pacientes relatam parentes de primeiro grau com sintomas, e estudos com gêmeos sugerem alta influência genética. Ainda assim, a expressão clínica depende da interação entre predisposição e ambiente.
Genes mais estudados
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MEIS1: associado de forma consistente; envolve desenvolvimento neural e regulação de ferro no SNC.
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BTBD9: relacionado a vias dopaminérgicas e circuitos do movimento.
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PTPRD: participa da comunicação sináptica.
Esses genes aumentam o risco, mas não causam a síndrome isoladamente.
Ferro, dopamina e cérebro
Dois eixos fisiopatológicos se destacam:
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possível deficiência de ferro no sistema nervoso central, afetando neurônios dopaminérgicos;
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alterações na neurotransmissão dopaminérgica, essenciais ao controle motor.
Muitas variantes genéticas associadas à SPI impactam justamente essas vias.
Fatores que “ativam” a predisposição
Mesmo com variantes de risco, a síndrome pode não se manifestar. Entre os gatilhos/agravantes estão: deficiência de ferro ou anemia, uso de certos medicamentos (antidepressivos, antipsicóticos, antieméticos), consumo excessivo de cafeína/álcool/tabaco, gravidez, insuficiência renal e privação de sono.
Implicações práticas
Para pessoas predispostas, monitorar ferro, ajustar estilo de vida e evitar gatilhos pode reduzir sintomas. Em casos selecionados, suplementação de ferro e terapias dopaminérgicas, com acompanhamento médico, são opções baseadas em evidências.
Referências
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MEDLINEPLUS. Restless Legs Syndrome (Willis-Ekbom disease). U.S. National Library of Medicine, 2024. Disponível em: https://medlineplus.gov/genetics/condition/restless-legs-syndrome/